05 junho, 2007

“Aquém do esperado” by Ma Si Ka

A proposta de revisão da lei laboral é hoje discutida e votada na generalidade pelos deputados. O diploma surge 18 anos depois da entrada em vigor da actual legislação e, entre a comunidade jurídica, o sentimento comum é o de que “se esperou tempo demais”. E o resultado final, ainda que melhor do que o que existe, parece ficar “aquém do esperado”.

A avaliar pelas diferentes leituras dos juristas ouvidos pelo Hoje Macau, a questão dos acordos entre empregadores e empregados permitidos pela lei e o risco de os mesmos se sobreporem ao estipulado no diploma promete dar trabalho aos deputados. Para um dos juristas não há motivo de alarme, para outros a redacção é “confusa”, “dúbia” e pode ser “perigosa” para o trabalhador.
Para Óscar Madureira, advogado que trabalha em direito laboral, a nova proposta de lei, “dum ponto de vista global”, “fica um pouco aquém do que se esperava”. Sobretudo, diz, “quando comparada com as legislações europeias”, já que se verifica que “poderia ter assegurado melhor os direitos dos trabalhadores”.
O “caso mais flagrante”, para o advogado, é o da licença de maternidade. O diploma propõe que a licença passe dos actuais 35 para os 56 dias, mas o causídico considera que, mesmo assim, ainda é pouco. “Podem evoluir um pouco mais. Isto é um volte face no que se esperava”, comentou ao Hoje Macau, lembrando os 90 dias aplicados aos funcionários públicos da RAEM ou aos trabalhadores no continente chinês.
A licença da maternidade, frisa, é apenas um desses casos. O dos feriados obrigatórios é outro, diz, onde se poderia ter ido mais longe. “Enquanto Macau não tiver uma legislação laboral que lhe permita ser competitivo” e salvaguardar os direitos dos trabalhadores, afirma Madureira, o “próprio desenvolvimento da RAEM enquanto economia” poderá ser colocado em causa.

Lei dúbia
ou clara?

A eventual falta de clareza da lei – invocada por vários deputados, como Kwan Tsui Hang –, no que concerne o risco de os acordos feitos entre empregadores e empregados se poderem sobrepor aos critérios mínimos fixados no diploma, não preocupa, porém, Óscar Madureira. “Os pactos sociais são admissíveis nos dias que correm e muito praticados. Mas só deverão contar quando sejam mais favoráveis para o trabalhador”, defende. E a proposta de lei, nos termos em que está escrita, salvaguarda isso? Sim, diz Madureira.
Não, afirma Miguel Almeida. Segundo o também especialista em direito laboral, contactado pelo Hoje Macau, os pontos 1 e 2 do artigo 2º estão “em completa oposição” e tornam “dúbia” a interpretação do diploma.
Recorde-se que o primeiro ponto da proposta diz que “os empregadores e os trabalhadores podem celebrar livremente contratos de trabalho, observando os critérios legais mínimos, salvo em situações em que a presente lei autoriza a celebração de acordo por ambas as partes”. O segundo ponto acrescenta que “caso o empregador e o trabalhador não tenham acordado sobre as condições de trabalho, são obrigados aos critérios mínimos definidos na presente lei”.
Para Miguel Almeida, “a actual proposta dá mais possibilidade às partes de fugir” ao que diz a lei. O que, sublinha, poderá ter consequências mais negativas para os trabalhadores, já que são “a parte mais fraca” e, se a entidade patronal “tiver uma posição de predomínio económico ou jurídico” – como geralmente acontece –, a lei “acaba por ser esvaziada”.
E nem o “princípio do mais favorável”, contemplado no artigo 6º, parece chegar, no entender do causídico, para evitar confusões na interpretação do documento. Dúvidas que, prevê, a manter-se a redacção do diploma, “só vão dar trabalho aos tribunais”.
“Parece que há ainda muitos buracos para o lado do trabalhador”, sentencia Almeida, aludindo também ao trabalho que os deputados têm pela frente e defendendo que o artigo 2º deveria ser revisto, por poder ser “perigoso” para os trabalhadores.
Quererá isto dizer que a nova proposta de revisão da lei laboral pode acabar por ser um passo atrás em relação à actual? “Não. Não é um passo atrás. Talvez não seja é tão à frente quanto os trabalhadores gostariam”, comenta, lamentando, no entanto, que “em 18 anos, evoluiu-se menos”
Mas isso não implica, ressalva, que o diploma venha privilegiar o patronato. Porque, ainda assim, defende, o certo é que o documento “será tanto mais prejudicial para o empregador quantos mais pontos estiverem previstos na lei”.
E são vários os artigos em que isso acontece, admite, aludindo, por exemplo, à definição e cálculo do salário e à inclusão das gorjetas – o que actualmente não acontece –, à especificação dos acréscimos salariais, à clarificação dos descansos semanais, até mesmo à clarificação dos “prazos de prescrição dos créditos” pedidos pelos trabalhadores depois de despedidos. Mesmo a licença de maternidade, lembra, consiste uma melhoria, embora fique “ainda longe”.
Apesar das críticas e de entender que se “esperou muito desde 1989”, o advogado considera que “as coisas se fazem a pouco e pouco” e que, “neste momento, é quase impossível ir-se mais longe” em Macau. Sobretudo num altura em que, na RAEM, “o lobby do jogo é muito grande”.

5 comentários:

Mãe babada disse...

Foi com enorme orgulho que comprei, li a notícia e guardei o jornal; com a certeza de que esta será a primeira, de muitas e pertinentes intervenções do nosso Ma Si Ka!

BBAM! disse...

Jacinto,
Muitos parabens! Tenho a certeza que esta foi uma de muitas intervenções!

Força!

Anónimo disse...

Depois de ler o tema de hoje do blog, recostei-me na cadeira e pensei:
-estou contente(sabes como gosto de sorrir),
-vou felicitá-lo, pela lucidez do comentário e pelo trabalho desenvolvido,
-desejar que continues com o mesmo empenho que tens tido até aqui, desta vez com a minha opinião positiva.

A persistência e a inovação são cada vez mais o caminho de sucesso, para qualquer país empreendedor.

Forte abraço MÂE

Porto Tónico disse...

O nosso Ma Si Ka já a "dar cartas" em Macau! Este "Pang Iao" ainda vai dar muito que falar!

Abraços e parabéns.

Anónimo disse...

Irmandade

Por favor, não deixem de fazer as respectivas traduções linguísticas, sempre que escreverem ou fizerem um comentário na "vossa nova lingua".

Mas o que quer dizer "Pang I ao"? Será páginas?
Santa ignorancia ocidental

BJocas